Como médico que era, São Lucas investigou com precisão os momentos mais significativos da história de Jesus Cristo e, como não poderia deixar de ser, foi às testemunhas oculares mais importantes.
De Nossa Senhora certamente ouviu o episódio que conhecemos hoje da concepção de João Batista, que ocorreu algum tempo depois do anúncio do arcanjo Gabriel ao seu pai, Zacarias. A revelação divina que lhe fez o arcanjo – “desde o ventre da mãe ficará cheio do Espírito Santo” – permite-nos concluir que a identidade dessa criatura concebida no útero de Isabel é de uma pessoa, aquela que preparou o caminho do encontro da humanidade com o Senhor do céu e da Terra, o Filho de Deus vivo.
Também dela, o evangelista conheceu o tempo exato do envio divino do mesmo arcanjo Gabriel a uma aldeia da Galiléia chamada Nazaré. “Quando Isabel estava no sexto mês”, Maria ouviu a mensagem de Deus que lhe revelava a maternidade única que ela iria ter: “Conceberás e darás à luz um filho, e lhe porás o nome de Jesus (...) aquele que vai nascer será chamado santo, Filho de Deus”.
Dos pastores que tomavam conta do rebanho na região próxima da gruta de Belém, São Lucas soube que eles foram os primeiros que receberam a notícia jubilosa do nascimento temporal do Filho eterno de Deus. “Eu vos anuncio uma grande alegria, que será também a de todo o povo: hoje, na cidade de Davi, nasceu para vós o Salvador, que é o Cristo Senhor!”
Para quem estudou medicina não se tem a mínima dúvida de que a concepção, efeito biológico imediato à fecundação, traz à história do mundo um novo homem ou uma nova mulher, isto é, uma nova e inigualável pessoa, um filho ou uma filha que sempre terá com os seus genitores um vínculo natural, ainda que seus pais não queiram alegrar-se com essa “novidade” em suas vidas.
Na proximidade da comemoração do Natal, salta à vista o sentido pleno da concepção e do nascimento de um filho, de uma filha, que não é outro senão o “novo e o eterno” que entram na história de pessoas já concebidas, já nascidas, já anteriormente reconhecidas e acolhidas, e esta entrada dá-se num preciso ano da história da vida de seus pais, dos seus avós, dos seus bisavós, etc.
Quando os pais e parentes tomam consciência de uma gravidez, já está o “novo e o eterno” ser humano presente como alguém que começou a sua história de vida e que existirá a partir de sua concepção como protagonista de um processo unitário e global, que no tempo tem uma orientação para a eternidade.
É verdade que a vida temporal não é a última realidade, mas sim a penúltima. Em todo caso trata-se de uma realidade sagrada, que foi confiada à própria pessoa e aos seus pais para ser vivida com sentido de responsabilidade e com amor conceituado como dom de si.
No Natal não se pode ocultar uma sombra, a do sofrimento humano, que parece turvar a luminosidade da vida oferecida por Deus como um dom. É novamente o médico São Lucas quem, pesquisando com Nossa Senhora como foram os dias seguintes ao seu parto virginal, ouviu-a contar que ao se completaram os dias da purificação – 40 dias – levaram o Menino recém-nascido a Jerusalém para ser apresentado no Templo. Aí, diante de um homem justo e piedoso, Simeão, ela e São José conheceram a dor que acompanharia a sua maternidade: “Ele será um sinal de contradição, e uma espada transpassará a tua alma”.
Por causa dessa previsão, um médico, que é formado para salvar vidas, para curar doenças e para aliviar as dores pessoais, ao ter diante de si a sombra do sofrimento e da morte procura reagir com uma atitude digna da sua profissão: eliminar as espadas que transpassam a alma humana. Nunca e jamais deveria eliminar as pessoas que sofrem, tirando-lhes a vida. Nunca e jamais os médicos devem permitir que a dignidade da medicina fique manchada ou degradada por aquelas pessoas ou por aquelas ideologias que querem promover na humanidade a cultura da morte.
A medicina é a arte de curar (ars curandi), não de matar! Os médicos são também pessoas humanas que um dia foram concebidas e nasceram como “o novo e o eterno” presentes na história de pessoas que já existiam e não foram mortas, e tampouco foram abandonados ou marginalizados por causa de alguma anomalia física ou mental.
O Natal é a festa da vida e, consequentemente, é a festa do sim ao novo e ao eterno introduzidos no mundo! Acredito também que o Natal é a festa da medicina e da cultura da vida, que tem nos médicos e nas médicas, nas enfermeiras e nos enfermeiros, nos juristas e nos políticos, nos gestores da cultura da humanidade, os seus promotores de vanguarda.
Porque é a festa da vida cabe aos médicos e demais profissionais da saúde serem os construtores de uma cultura marcada prioritariamente pelo valor do ser sobre o ter, pelo interesse pelos outros sobre a recusa dos outros, pelo reconhecimento das pessoas, especialmente as mais frágeis, como um dom precioso sobre a acusação das mesmas como pessoas intrusas, inesperadas e inconvenientes.
Cabe também aos estudantes de medicina e de enfermagem, aos estudantes de Direito e de relações internacionais resistirem a essas pressões ideológicas que querem comprimi-los no estreito espaço de um pensamento científico débil e enganoso. Tal modo de pensar quer introduzir na formação acadêmica o deslumbramento pelas possibilidades infinitas que o progresso das ciências, da tecnologia e da cultura proporcionam, quando na verdade o que se pretende é negar à inteligência humana a possibilidade humilde de raciocinar como criatura e não como Criador, como servidor da vida humana e não como predador da humanidade.
O Natal surge no final do ano como um horizonte do qual emerge uma luz esplendorosa, a luz da verdade sobre o valor inestimável e sagrado da pessoa concebida certamente graças a um processo biológico, mas, sobretudo, por uma vontade sábia, amorosa e livre de Deus.
“Façamos o ser humano à nossa imagem e segundo a nossa semelhança” (cf. Bíblia Sagrada, Ed. CNBB, oitava edição) é uma revelação inequívoca a respeito da verdadeira origem, dignidade e destino de cada pessoa; é uma frase que ilumina o valor e o sentido do “novo e o eterno” que vem para enriquecer e embelezar o que já existe dentro da humanidade há muitos séculos.
Certamente, o futuro da humanidade tem no Natal aquele “solo musical” que chama a atenção dentro de uma sinfonia, quando o seu tema é confiado a um só instrumento ou a uma só voz. O que irá acontecer amanhã dentro da civilização humana dependerá muito da interpretação que se dará à celebração natalina, pois esta festa revela-nos que graças à concepção do Filho eterno do Pai por obra do Espírito Santo e pela resposta afirmativa de Maria, a Palavra de Deus “já não é apenas audível, não possui somente uma voz; agora a Palavra tem um rosto, que por isso mesmo podemos ver: Jesus de Nazaré” (cf. Ex. Ap. Verbum Domini, n. 12).
De Nossa Senhora certamente ouviu o episódio que conhecemos hoje da concepção de João Batista, que ocorreu algum tempo depois do anúncio do arcanjo Gabriel ao seu pai, Zacarias. A revelação divina que lhe fez o arcanjo – “desde o ventre da mãe ficará cheio do Espírito Santo” – permite-nos concluir que a identidade dessa criatura concebida no útero de Isabel é de uma pessoa, aquela que preparou o caminho do encontro da humanidade com o Senhor do céu e da Terra, o Filho de Deus vivo.
Também dela, o evangelista conheceu o tempo exato do envio divino do mesmo arcanjo Gabriel a uma aldeia da Galiléia chamada Nazaré. “Quando Isabel estava no sexto mês”, Maria ouviu a mensagem de Deus que lhe revelava a maternidade única que ela iria ter: “Conceberás e darás à luz um filho, e lhe porás o nome de Jesus (...) aquele que vai nascer será chamado santo, Filho de Deus”.
Dos pastores que tomavam conta do rebanho na região próxima da gruta de Belém, São Lucas soube que eles foram os primeiros que receberam a notícia jubilosa do nascimento temporal do Filho eterno de Deus. “Eu vos anuncio uma grande alegria, que será também a de todo o povo: hoje, na cidade de Davi, nasceu para vós o Salvador, que é o Cristo Senhor!”
Para quem estudou medicina não se tem a mínima dúvida de que a concepção, efeito biológico imediato à fecundação, traz à história do mundo um novo homem ou uma nova mulher, isto é, uma nova e inigualável pessoa, um filho ou uma filha que sempre terá com os seus genitores um vínculo natural, ainda que seus pais não queiram alegrar-se com essa “novidade” em suas vidas.
Na proximidade da comemoração do Natal, salta à vista o sentido pleno da concepção e do nascimento de um filho, de uma filha, que não é outro senão o “novo e o eterno” que entram na história de pessoas já concebidas, já nascidas, já anteriormente reconhecidas e acolhidas, e esta entrada dá-se num preciso ano da história da vida de seus pais, dos seus avós, dos seus bisavós, etc.
Quando os pais e parentes tomam consciência de uma gravidez, já está o “novo e o eterno” ser humano presente como alguém que começou a sua história de vida e que existirá a partir de sua concepção como protagonista de um processo unitário e global, que no tempo tem uma orientação para a eternidade.
É verdade que a vida temporal não é a última realidade, mas sim a penúltima. Em todo caso trata-se de uma realidade sagrada, que foi confiada à própria pessoa e aos seus pais para ser vivida com sentido de responsabilidade e com amor conceituado como dom de si.
No Natal não se pode ocultar uma sombra, a do sofrimento humano, que parece turvar a luminosidade da vida oferecida por Deus como um dom. É novamente o médico São Lucas quem, pesquisando com Nossa Senhora como foram os dias seguintes ao seu parto virginal, ouviu-a contar que ao se completaram os dias da purificação – 40 dias – levaram o Menino recém-nascido a Jerusalém para ser apresentado no Templo. Aí, diante de um homem justo e piedoso, Simeão, ela e São José conheceram a dor que acompanharia a sua maternidade: “Ele será um sinal de contradição, e uma espada transpassará a tua alma”.
Por causa dessa previsão, um médico, que é formado para salvar vidas, para curar doenças e para aliviar as dores pessoais, ao ter diante de si a sombra do sofrimento e da morte procura reagir com uma atitude digna da sua profissão: eliminar as espadas que transpassam a alma humana. Nunca e jamais deveria eliminar as pessoas que sofrem, tirando-lhes a vida. Nunca e jamais os médicos devem permitir que a dignidade da medicina fique manchada ou degradada por aquelas pessoas ou por aquelas ideologias que querem promover na humanidade a cultura da morte.
A medicina é a arte de curar (ars curandi), não de matar! Os médicos são também pessoas humanas que um dia foram concebidas e nasceram como “o novo e o eterno” presentes na história de pessoas que já existiam e não foram mortas, e tampouco foram abandonados ou marginalizados por causa de alguma anomalia física ou mental.
O Natal é a festa da vida e, consequentemente, é a festa do sim ao novo e ao eterno introduzidos no mundo! Acredito também que o Natal é a festa da medicina e da cultura da vida, que tem nos médicos e nas médicas, nas enfermeiras e nos enfermeiros, nos juristas e nos políticos, nos gestores da cultura da humanidade, os seus promotores de vanguarda.
Porque é a festa da vida cabe aos médicos e demais profissionais da saúde serem os construtores de uma cultura marcada prioritariamente pelo valor do ser sobre o ter, pelo interesse pelos outros sobre a recusa dos outros, pelo reconhecimento das pessoas, especialmente as mais frágeis, como um dom precioso sobre a acusação das mesmas como pessoas intrusas, inesperadas e inconvenientes.
Cabe também aos estudantes de medicina e de enfermagem, aos estudantes de Direito e de relações internacionais resistirem a essas pressões ideológicas que querem comprimi-los no estreito espaço de um pensamento científico débil e enganoso. Tal modo de pensar quer introduzir na formação acadêmica o deslumbramento pelas possibilidades infinitas que o progresso das ciências, da tecnologia e da cultura proporcionam, quando na verdade o que se pretende é negar à inteligência humana a possibilidade humilde de raciocinar como criatura e não como Criador, como servidor da vida humana e não como predador da humanidade.
O Natal surge no final do ano como um horizonte do qual emerge uma luz esplendorosa, a luz da verdade sobre o valor inestimável e sagrado da pessoa concebida certamente graças a um processo biológico, mas, sobretudo, por uma vontade sábia, amorosa e livre de Deus.
“Façamos o ser humano à nossa imagem e segundo a nossa semelhança” (cf. Bíblia Sagrada, Ed. CNBB, oitava edição) é uma revelação inequívoca a respeito da verdadeira origem, dignidade e destino de cada pessoa; é uma frase que ilumina o valor e o sentido do “novo e o eterno” que vem para enriquecer e embelezar o que já existe dentro da humanidade há muitos séculos.
Certamente, o futuro da humanidade tem no Natal aquele “solo musical” que chama a atenção dentro de uma sinfonia, quando o seu tema é confiado a um só instrumento ou a uma só voz. O que irá acontecer amanhã dentro da civilização humana dependerá muito da interpretação que se dará à celebração natalina, pois esta festa revela-nos que graças à concepção do Filho eterno do Pai por obra do Espírito Santo e pela resposta afirmativa de Maria, a Palavra de Deus “já não é apenas audível, não possui somente uma voz; agora a Palavra tem um rosto, que por isso mesmo podemos ver: Jesus de Nazaré” (cf. Ex. Ap. Verbum Domini, n. 12).
Dom Antonio Augusto Dias Duarte - Bispo Auxiliar da Arquidiocese do Rio de Janeiro